terça-feira, 9 de junho de 2020

nove de junho e a linha de frente

Tem coisa que não dá pra dimensionar. Penso em um jeito de começar, mas nada me parece combinar. Gostaria que todas as pessoas deixassem de ter arrependimentos. Que a culpa não desse mais as caras. Tenho tido dificuldade em escrever poemas. Mas é a vida. Os dias não tem sido fáceis. Todo dia uma preocupação e eu ainda invento de me arrepender? Atrás da porta do quarto estão pendurados os calendários dos meses desde quando essa loucura começou. 17 de março nasce e a vida já não é a mesma no Piauí. De repente o que acontece lá, chega aqui. De repente a gente é parte do mundo. Um dar-se conta de tirar o chão debaixo dos nossos pés. Lembro de ir para o hospital e a rua estar diferente. Não tinha dado a importância necessária para o decreto de isolamento que saiu no dia anterior. Afinal, ainda não éramos parte do mundo. Não que eu quisesse sair por sair ou fazer parte do mundo, sei lá. Eu saí naquela manhã e continuo saindo desde então, quase três meses depois, por que é o que eu preciso fazer. O hospital tem gerador e não para de verdade. Nem pra gente sentir. Os plantões permanecem independente da dor de dente, da cólica, ou da falta de jeito em existir que nos acomete às vezes em certas manhãs. Me perdi da rima. Talvez por que os dias estão mais duros. E se eu tiver feito uma escolha errada? Me perdi da poesia, mas o arrependimento não dá trégua. Me pego com vontade, uma vontade medonha de desistir. A última vez já faz mais de um ano, nem lembrava a cor do medo. Tenho medo de não ver mais os meus. Esse medo é imenso e me deixa do tamanho do nada. Tem passo que é tão difícil de dar. Pra frente ou pra trás, não importa. Quase três meses no sufoco e o medo de cair me pegou. Vivencio outras quedas. Agora eu só queria um colo pra desabar. Mas tá em falta. Uma ausência que desespera como a do álcool em gel e das máscaras. É o jeito seguir desabando em palavras.

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